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Reduções na jornada de trabalho

Uma comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou recentemente a redução da jornada de trabalho máxima de 44 para 40 horas semanais, sem redução do salário.

Uma comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou recentemente a redução da jornada de trabalho máxima de 44 para 40 horas semanais, sem redução do salário. A proposta prevê ainda um aumento do valor da hora-extra de 50% para 75% do valor normal do salário. Ela deverá ser votada no plenário da Câmara em breve e muito provavelmente será aprovada. Mas, do ponto de vista econômico, será que reduções da jornada de trabalho conseguem mesmo gerar mais empregos?

Para analisar o impacto desta medida é necessário, em primeiro lugar, examinar a distribuição das horas trabalhadas atualmente no Brasil. A figura ao lado mostra a evolução das jornadas de trabalho no setor formal da economia brasileira nos últimos 25 anos. Em 2007 (último ano com informações disponíveis), 10% dos trabalhadores tinham jornada semanal inferior a 40 horas (trabalho parcial), 35% trabalhavam mais do que as 44 horas permitidas por lei, 31% trabalhavam exatamente 40 horas e 24% tinham jornada entre 41 e 44 horas. Somente este último grupo será afetado pela reforma, ou seja, quase 7 milhões de trabalhadores. No setor informal (empregados sem carteira assinada, que às vezes acompanham as mudanças do setor formal), somente 11% dos trabalhadores pertence a esse grupo.

Mas, será que estes sete milhões de trabalhadores serão realmente afetados pela nova lei? Tudo indica que sim. A figura mostra que a última grande alteração na distribuição das jornadas aconteceu entre 1987 e 1989, como decorrência das mudanças introduzidas pela Constituição de 1988, que diminuiu a jornada máxima de 48 para 44 horas. Entre estes dois anos, a proporção de trabalhadores com jornada entre 41 e 44 horas aumentou de 8% para 23%, enquanto que a parcela com jornadas acima de 44 horas diminuiu de 54% para 32%. Ou seja, as mudanças na legislação têm efeitos no mundo real.

Os proponentes da reforma pensam da seguinte maneira: se 10 pintores levam 440 horas para pintar uma parede, quantos pintores seriam necessários para pintar a mesma parede, se cada um deles pudesse trabalhar apenas 40 horas? A simples aritmética nos diria que seriam necessários 11 pintores, ou seja, precisaríamos contratar um trabalhador adicional. O problema com este raciocínio é que ele esquece que as firmas operam com outros fatores de produção e que tentam produzir reduzindo seus custos ao máximo. Assim, se a nova lei diz que os 10 pintores podem trabalhar no máximo 40 horas por semana e que o valor da hora extra será aumentado, a empresa pode decidir que vale a pena demitir alguns dos pintores e comprar máquinas de pintar paredes para aumentar a produtividade dos pintores restantes.

Em linguagem econômica, se o custo das máquinas permanecer constante, enquanto a jornada de trabalho máxima diminui e o valor da hora extra aumenta, haverá um aumento do custo relativo do trabalho. Este aumento, por sua vez, tende a gerar aumento de preço, redução de produção e substituição de trabalhadores por máquinas nas empresas que empregam muitos trabalhadores com jornadas de 44 horas semanais.

Uma pesquisa anterior ("Os efeitos da redução da jornada de trabalho de 48 para 44 horas semanais sobre o mercado de trabalho no Brasil", por Gustavo Gonzaga, Naercio Menezes Filho e José Marcio Camargo) analisou os impactos da redução de jornada de 1988 sobre o emprego e o salário dos trabalhadores. Verificou-se que a redução da jornada efetivamente ocorreu e que ela aumentou o salário real dos trabalhadores afetados, sem provocar seu desemprego. Não há, entretanto, evidências de geração de novos empregos com aquela reforma. Além disto, a situação econômica em 1988 era muito diferente dos dias de hoje. A economia era fechada, o que permitia que os setores oligopolizados repassassem facilmente seus aumentos de custos para os preços. Além disto, 1989 foi um ano de brutal aceleração inflacionária, o que encorajava variações de salários reais como a primeira margem de ajuste por parte das firmas, ao invés de ajuste de emprego.

Nada garante que os efeitos serão similares desta feita. Muito provavelmente, sairão ganhando os trabalhadores que permanecerem nas empresas afetadas trabalhando menos horas. E perderão os trabalhadores que porventura forem demitidos e os consumidores dos produtos destas firmas, que terão que pagar um preço maior pelos seus produtos. As empresas menores serão as que mais sofrerão. De qualquer forma, dado que uma parcela grande dos trabalhadores não será afetada, os efeitos macroeconômicos deverão ser pequenos.

Naércio Menezes Filho, professor titular (cátedra IFB) e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa e professor da FEA-USP, escreve mensalmente às sextas-feiras.

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